terça-feira, 7 de setembro de 2010

Artigo de Alex de Souza sobre o Cultura em Debate

Apenas um Pitaco
Por Alex de Souza

Acho que até Iberê está careca de saber (desculpe, nunca resisto a essa piada) que o debate sobre cultura com os candidatos ao governo será nesta quarta-feira à noite. Participam os três mais bem postos à mesa: além do supracitado, tem ainda Rosalba e Carlos Eduardo. Será na Casa da Ribeira e coisa e tal (aqui).
Fui até convidado pelos dois grupos que estão organizando a parada, a Revista Catorze e o Núcleo de Jovens Artistas (valeu, caras!), mas não vai dar para estar em Natal no dia. Isso não significa que eu vá perder a chance de dar um pitaco sobre uns dois ou três assuntos interessantes sobre os quais os candidatos poderiam falar.

Aliás, antes disso, lembrei de um assunto que não me interessa nem um pouco: festa. Até porque tenho certeza que os três reis magos vão falar tanto de festa, que me daria vontade de colocar um cocar de penas e começar a sambar. Geralmente quem vem com esse papo não tem uma visão sobre cultura que vá muito além disso. Beleza: festa é bacana, todo mundo gosta e uma ruma de gente tira um troco com elas. Mas se for assim, que tal sugerir um calendário de eventos consistente, que contemple as diferentes regiões do estado, com regras claras para concessão de apoio público a cada iniciativa? De preferência, contemplando as diferentes tendências, gostos e estilos. Só se fala em porra de auto. Sinceramente. Por que não festivais regionais de teatro, colocando os artistas para circular, promovendo a formação deles e de novos pelo intercâmbio e pulverizar a audiência (mas por favor sem matar o povo), apresentando em escola, teatrinho, casa de cultura e o escambau? Pelo menos assim, agrada àqueles com visão meramente utilitarista da cultura e faz algo de futuro pela classe.

Eu queria muito que alguém me dissesse o que diabos vai fazer com a Fundação José Augusto, esse bode antediluviano atravessado da sala ao quintal. Além de uma estrutura sucateada e funcionários desestimulados, um esquema de desvio de verbas públicas montado na Casa Civil do governo Wilma de Faria por gente de boa família conseguiu piorar o que já era muito ruim bote aí uns 20 anos.
Não bastasse a dotação orçamentária vergonhosa, a FJA terminou soterrada por uma burocracia brutal. Se você aliar isso à incompetência administrativa dos atuais gestores, dá para entender o atual estado das coisas por lá. Como todo governante com mandato novinho adora uma reforma administrativa, que tal sugerir o compromisso de uma mudança radical naquele buraco, de preferência que garanta autonomia administrativo-financeira ao órgão? É o único modo de se ter planejamento, o que duvido já haver existido na FJA.

A atual gestão ao menos criou câmaras setoriais. Tudo bem que elas não funcionam a contento e estão esvaziados (também, já pensou passar dois, três meses discutindo a criação de um edital e não ver o bichinho sair da toca dois anos depois?). Mas são espaços ideais para discutir ações para cada expressão artística ouvindo àqueles que as fazem: eu, você e aquele outro cara esquisito ali do lado. É disso que precisamos: de espaço para sermos ouvidos e levados em consideração. Aí as coisas acontecem.


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Aproveitando o gancho anterior, apresento minha crítica também ao evento em si. É louvável propor uma discussão que trate exclusivamente de cultura. Sou um cara novo, mas como tem eleição de 2 em 2 anos nesta birosca, já vi algumas campanhas e não lembro de nenhuma deste tipo promovida anteriormente. Mais uma vez parabéns à galera que propôs e organizou.
Mas debate é um troço que já era. Tem um apelo apenas midiático. E nem o povão mais curte, é só reparar nos índices de audiência dos promovidos pelas tevês. Além de vir com umas regras chatas, que limitam as falas dos candidatos.

Num lugar com 160 lugares, somos (teoricamente) um público qualificado que entende (teoricamente) do tema. Se for para falar de cultura, deixem os caras falarem. Quero escutá-los, retrucá-los, redargüi-los. Fabrício Nobre e sua turma, lá em Goiás, promoveram encontros individuais, sabatinas, com os candidatos ao governo.

É muito fácil encarar as notórias nulidades da política potiguar discutindo cultura por 5 minutos. Queria ver elas trocarem uma ideia conosco por 2 horas, sozinhas, como elas adoram fazer com empresários e comerciantes.

Seria também uma forma de discutirmos uma política cultural, da qual somos tão carentes. Até porque não lembro de, em momento algum nos quatro anos que antecederam esta eleição, ter ouvido falar de algum grupo político que convidou alguma entidade representativa da classe artística para discutir ou formatar um esboço de programa de governo. Coisas de uma democracia de espetáculo, aquela que precisa de hora marcada e autorização da justiça para acontecer.


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Essas mal traçadas acima são também uma resposta com mais de 140 caracteres para a jornalista Ramilla Souza, com quem tive o prazer de conversar rapidamente ontem à noite sobre política. Nos últimos anos tenho até me esforçado para votar num ou outro candidato a cada eleição. Mas sou a favor do voto nulo. Se você não curte viajar pro exterior, sou a favor de não ir nem lá pr’essa babaquice que é ‘justificar’ o voto ou teclar números não-cadastrados. Acho até mais complicado justificar o voto em certas criaturas do que não querer sair de casa para votar nelas.

Mas isso não signifique que despreze a política. Estou, sim, rodriguesneteando para esses caras que acham que fazem política e suas estruturas viciadas de poder. Faço política olhando criticamente para as ações deles e de seus apaninguados, trocando idéias com meus semelhantes aqui e acolá em alguns artigos, faço política quando escrevo meus continhos de ficção científica. Aí, aqueles que se importam com os ‘canais institucionais de representação democrática’, como você, Ramilla, os meninos do Núcleo de Jovens Artistas, a turma da Revista Catorze, e tantos outros grupos organizados e atuantes, podem dialogar comigo e com quem mais tiver afim, sobre como podemos mudar as coisas.

Fonte: Substantivo Plural

Um comentário:

  1. Ótimo texto do Alex. As críticas serão válidas para as próximas eleições, sem dúvida. =]

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